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quinta-feira, 31 de julho de 2008

DO USO IRRACIONAL DE ALGEMAS: O ESPETÁCULO MIDIÁTICO DA POLÍCIA FEDERAL

É inegável que a Polícia Federal brasileira tem ganhado notoriedade e credibilidade muito acentuada em todo o país, tanto que, por muitos, a ela é creditado o status de “melhor instituição” pátria (à frente do Poder Judiciário e do Ministério Público). Boa parte dessa confiança depositada veio por sua aparente efetividade na investigação daquilo que se convencionou chamar de “organizações criminosas”, principalmente aquelas relacionadas à delinqüência econômica (de colarinho branco). Afora isso, outro vetor que vem a elevar a credibilidade de nossos incansáveis agentes é a contínua exposição à mídia, afinal, se a imprensa vai noticiar o serviço da Polícia Federal, esse deve parecer ter sido bem feito, mesmo que a custo de arbitrariedades e propaganda institucional.
Um exemplo de arbitrariedade é, inegavelmente, o uso indiscriminado de algemas. A truculência nessa conduta está no fato, em primeiro lugar, de a lei brasileira não prever o uso desses instrumentos de cerceamento da liberdade. Uma única exceção se observa no Código Penal Militar, que em seu artigo 234, § 1º, acena que o uso de algemas [...] deve ser evitado, desde que não haja perigo de fuga ou de agressão da parte do preso [...], em outras palavras, o emprego de algemas é exceção e não regra. Em segundo lugar, em vista da ofensa a direitos fundamentais, estabelecidos, por exemplo, em nossa Constituição Federal, em seu artigo 5º, III: [...] ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante [...]. É, ainda, em decorrência desse último dispositivo que se observa o próximo aspecto: a propaganda institucional.
No que concerne à propaganda institucional, essa é alimentada pela velocidade da mídia, uma mazela de nossos dias. Com efeito, a contemporaneidade pode ser observada, parafraseando o Ministro do STF Carlos Brito, no julgamento do Habeas Corpus n.º 89.429, como a “idade mídia”. Observa-se, nesse sentido, que, na atualidade, as pessoas perderam boa parte de sua privacidade, tanto é assim que somos filmados nas ruas, nos shoppings, somos relacionados na internet et coetera, de modo que não poderia ser diferente com a privacidade das pessoas que são presas, tendo em vista que em razão de seu interesse público, as prisões são igualmente públicas. Ocorre que, em muitas ocasiões, valendo-se desse interesse público, a Polícia Federal arma um verdadeiro espetáculo: sob os títulos mais fabulosos (Operação Furacão, Operação Rodin, Operação Satiagraha, dentre outros), chama-se à atenção da mídia, (quando não raras vezes, nem os réus nem seus advogados sabem da investigação) e promove-se um verdadeiro circo, prisões, busca e apreensões e, é claro, o uso das algemas, mesmo quando o réu não oferece qualquer tipo de resistência. Com isso, a Polícia Federal passa à sociedade uma verdadeira sensação de segurança, conferindo à instituição generosa dose de credibilidade.
Todavia, essa efetividade apregoada pela Instituição e festejada pela mídia acaba por atropelar, a proteção à dignidade humana, valor basilar do Estado Democrático de Direito, tal qual é o Brasil. Ora, quando uma operação policial dá certo, os pretensos mal-feitores, junto aos eventuais frutos ou objetos do crime em tese são expostos sob um imenso emblema da Polícia Federal. Isso, associado ao uso das algemas acaba por pré-julgar, ao menos no plano dos fatos, o então investigado, que até o final do processo juridicamente é considerado inocente. Se ao final da instrução processual essa pessoa for absolvida, perante a sociedade permanecerá condenada.
Portanto, pretendemos deixar claro que não somos contra a Instituição Polícia Federal, que sabemos estar prestando um serviço indispensável e de grande inteligência. Tampouco o uso racional de algemas deve ser objeto de repúdio. O que apenas estamos tentando colocar é que a combinação de força e espetáculo está completamente dissociado daquilo que se entende por direito ou por justiça, ao contrário, tal evento em muito se assemelha aos jogos sangrentos promovidos no Coliseu, em que cristãos se viam obrigados a combaterem bestas: fica fácil adivinhar quem está perdendo com isso.
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Maurício Sant’Anna dos Reis
OAB/RS 69.452

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